sexta-feira, 1 de abril de 2011

Menino Música

Ele era uma criança como as outras e sua principal preocupação era divertir-se: corria, brigava com os irmãos, sorria, e fazia valer todos os verbos aos quais um garoto tem direito. Mas ele era especial, possuía em suas mão as gotas de harmonia e sintonia , os tons e sons.

Uma vez, em meio às brincadeiras, ele reconheceu um violão. A mãe, um amigo, quem o havia dado? Naquele momento não lembrava. Apenas sentiu um aperto em seu coração, um doce prazer desconhecido, uma leve agonia eram as luzes da música que o envolviam, e ele inebriado deixou-se estar e brincou. As notas eram difíceis, um pouco dolorosas, mas aos poucos iam surgindo de suas mãos. ”Era um garoto, que como eu, amava os Beatles e os Rolling Stones...” Sim, havia descoberto um novo verbo: musicar.

Daquele momento em diante, sempre que sentia aquela (já conhecida, mas ainda desorientadora) doce agonia, entregava-se ao prazer do novo verbo, e tocava, tocava. Em muitas dessas vezes aprendia um novo instrumento, e nesses dias ele ficava ainda mais feliz do que era sempre.

O tempo foi passando e o menino tocou em uma banda, e conquistou muitas meninas, inclusive a mulher de sua vida. Tocou em um grupo religioso, tocou em casa, saiu tocando! Um dia resolveu criar um coral, novo desafio pra suas mãos, mas se havia música, dos dedos surgiam as luzes da harmonia e em pouco tempo os acordes bailavam em seus olhos. Juntou um grupo de amigos e para fins religiosos começou a reger. Novamente o início era doloroso, mas seguia o ritmo de seu coração e... produzia música!

Mas as pedras da vida adulta bateram à sua porta e o menino de luzes musicais foi estudar. Sempre acompanhado dos acordes, tornou-se engenheiro e depois professor. Nesse momento a musica já coadjuvava, no entanto, por vezes seu coração acelerava e ele tocava, tocava.

A vida pede do homem mais do que ao menino, e aos poucos ele aprende escutar menos o coração. Brilha em sua vida profissional, reina na familiar, mas aquele verbo, aquele da infância, vai ficando cada vez mais em desuso. São muitas as atribuições de um adulto, não se pode perder tempo com sonhos juvenis. Até que em um domingo qualquer, ele chega em casa, entra no quarto do sobrinho, e os olhos brilham. O coração acelera. As mãos começam a estrelar. Um sorriso brota doce de seus lábios e ele se dirige, com a mesma angustia de anos atrás, àquele objeto - uma bateria!

E...toca, toca, toca...

(Suylene Tatiany - 27.03.11)


2 comentários:

  1. Eu somente completaria com uma pergunta de menino... "E ela tava dormindo?"

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  2. Bom relê-la...
    Apesar do muito tempo, não perdeu sua marca literária.

    bjo.
    Pê.

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